Comprei este livro do jornalista e blogger
Nuno Simas...
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Tem lá detalhes inéditos, de documentos que ele recolheu junto da biblioteca Gerald Ford. Há um ano, graças a outros documentos que também surgem no livro, fiz este artigo para a Focus...
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Podem encontrar
aqui os originais dos arquivos norte-americanos.
O Nuno Simas, contudo, começa o livro com a defesa da versão oficial de que os EUA estavam a "leste" em relação ao golpe que preparava para o dia 25 de Abril de 1974 e, mais à frente, cita Henry Kissinger a queixar-se de que os EUA não tinham de andar a prever golpes pelo mundo fora. Dito assim, parece mesmo que nada se sabia...
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Só que, em 2003, no livro "Eu Sei Que Você Sabe", apontei algumas evidências factuais que nos permitem pensar em sentido contrário. E isso começava com esta notícia do "Diário de Notícias" do dia 7 de Abril de 1974...
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Entenda-se que o embaixador norte-americano, Stuart Nash Scott, era uma pessoa inexperiente quanto à diplomacia de Portugal, pois chegara em Janeiro de 1974 e não conhecia muita gente em Lisboa. É dito que veio para cá apenas para gozar o sol porque Lisboa era um poiso onde nada se passava - excepto, é claro o conflito de Israel, em Outubro de 1973, que obrigara a uma acesa troca de telegramas diplomáticos entre Washington e Lisboa por causa do uso da base das Lajes nas missões norte-americanas de apoio ao governo de Telavive. Coisa pouca... Quem geria a embaixada norte-americana em Lisboa era um senhor chamado Richard Post, o número 2 e que substituira o anterior embaixador durante um ano. Richard Post, antes de vir para Lisboa, servira em Angola, onde conheceu muitos militares que viriam a subir ao poder depois do golpe.
Conforme me explicou um outro militar de Abril - Otelo Saraiva de Carvalho - qualquer golpe de Estado, para ter sucesso, tem de ocorrer numa terça-feira, quarta-feira ou quinta-feira... Porquê? Para haver tropas... Não se pode fazer uma revolução ao fim-de-semana ou nos dias mais próximos. O golpe das Caldas da Rainha, a 16 de Março de 1974, falhara porque acontecera de sexta-feira para sábado... Já o 25 de Abril de 1974 teve lugar numa quarta-feira para quinta-feira, uma das duas datas ideais para garantir o sucesso.
Um adido militar na embaixada norte-americana em Lisboa que estivesse em contacto com Washington e soubesse que algo se iria passar, mas desconhecesse a data concreta, saberia, contudo, que um golpe teria de ocorrer num daqueles três dias da semana.
Diz-nos a história, a PIDE sabia que se preparava algo em grande para o dia 1 de Maio de 1974, dia do Trabalhador, uma quarta-feira. Se tinha de haver um golpe de Estado em Portugal feito por tropas militares com uma linha de orientação próxima da NATO - ou seja, distante dos movimentos de esquerda que se previam formar no 1 de Maio "sangrento" - esse golpe teria de ter lugar na terça, quarta ou quinta-feira antes de 1 de Maio... Ou seja, nos dias 23, 24 ou 25 de Abril (26 seria sexta, 27 e 28 o fim-de-semana, segunda seria 29 e, terça-feira, dia 30 era um dia demasiado próxima do 1 de Maio).
Afastar o embaixador dos EUA de Lisboa nos dias 23, 24 e 25 de Abril era imperioso para garantir o sucesso do golpe, já que os EUA não podiam intervir ou correr o risco de serem considerados suspeitos de preparar ou apoiar os golpistas (se os EUA tivessem de intervir a 25 de Abril teriam de o fazer a favor de Marcello Caetano, uma vez que era ele o governante de um país membro da NATO e não convinha nada dar a entender que os EUA apoiaram golpes militares e mudança de regime dentro da esfera de influência NATO. Afinal, isto não era a Checoslováquia em 1968).
E assim aconteceu... E ainda hoje se defende que os EUA nada sabiam do que se iria passar.
Tenho pena que o Nuno Simas tenha embarcado pelo aspecto mais fácil que foi o de optar por esquecer aquela pequena notícia de 7 de Abril e as ponta soltas que a mesma comporta. Preferiu o lado mais simples para registar a História...
No meio disto tudo, desconheço ainda se o Nuno Simas viu o telegrama que o cônsul norte-americano em Luanda, Briggs, mandou para Washington a 7 de Janeiro de 1974 onde diz que um bem relacionado militar de baixa patente (seria um capitão?) o informou de que o golpe de extrema-direita de Kaúlza de Arriaga é algo "exagerado" em relação ao que se "estava realmente a preparar" - "what actually is afoot"... e o que se estava a preparar? o 25 de Abril de 1974, é claro...
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Se não acredita e que ver o original, vá
aqui.
Outro detalhe que mencionei há uns tempos é
o artigo do diário norte-americano "Washington Post", datado de 8 de Abril de 1974 - ou seja, o dia seguinte à publicação da notícia de que o embaixador dos EUA iria estar ausente de Lisboa no dia do golpe que se avizinhava -, onde se dá conta de que os homens de negócios em Portugal dão luz verde a uma mudança de regime no país desde que tal seja levada a cabo por Spínola...
Enfim, o que vale é que estou também a preparar uma continuação do "Eu Sei Que Você Sabe" - interrompida devido ao facto de ter escrito
"O Enigma da Praia da Luz" - mas em breve direi aquilo que continuam a não querer dizer-vos.
Etiquetas: 25 de Abril, Briggs, CIA, Diário de Notícias, eles sabiam, Eu Sei Que Você Sabe, Golpe de Estado, há quem ainda não queira saber, Henry Kissinger, Nuno Simas, Richard Post, Washington Post