20080521

Assim se fez história

Fui ao lançamento do livro "Fidel", do ex-embaixador de Portugal em Cuba, José Fernandes Fafe.



Conheci o autor do livro quando, em 1996, juntamente com o filho, José Paulo Fafe, tive o prazer e a honra de trabalhar com ambos em Cuba, durante um mês, na produção do documentário "O Enigma Cubano".
O embaixador Fernandes Fafe foi o primeiro representante diplomático português na ilha de Fidel após o 25 de Abril de 1974. O ministro do Negócios Estrangeiros era Mário Soares, amigo pessoal de Fernandes Fafe - ambos, inclusive, tinham visitado a ilha de Fidel em 1963. Clandestinos.
Durante a cerimónia de lançamento do livro, na Fundação Mário Soares, o autor convidou alguns protagonistas das histórias sobre os anos pós-revolução em que foi "O Nosso Agente em Havana", ou, como diz com o ar diplomático que o caracteriza, "O Vosso Agente em Havana". Uma dessas histórias conhecia-a em 1996 e dei até uma ajuda como jornalista para que a verdade fosse esclarecida.
Reza a lenda que, em finais de Julho de 1975, Fidel Castro recebeu Otelo Saraiva de Carvalho durante as celebrações do aniversário do assalto ao quartel da Moncada - o 26 de Julho. Otelo era então o homem forte do COPCON e Fidel pediu que mandasse uma mensagem ao Presidente da República, Costa Gomes. Era uma mensagem histórica. O líder cubano queria saber qual seria a reacção dos portugueses se os cubanos enviassem militares para Angola, respondendo assim a um pedido de Agostinho Neto, líder do MPLA. Recorde-se que, no Verão Quente de 1975, havia um risco de Guerra Civil em Portugal. A ponte aérea de Angola estava a começar e Lisboa enchia-se de retornados. Mas, a Independência de Angola só seria efectiva no dia 11 de Novembro...
Segundo aquilo que sempre se disse, Costa Gomes nunca terá recebido essa mensagem. Otelo, contudo, garantiu que a transmitira. Falei uma vez com Costa Gomes, que também me repetiu e garantiu que nunca recebera a mensagem de Otelo.
Fidel Castro esperou por uma resposta até que, num certo dia de meados de Setembro, e numa atitude complemente inédita ao nível das relações entre Estados, deslocou-se pessoalmente à chancelaria portuguesa em Havana onde o embaixador Fernandes Fafe terminava despreocupadamente um qualquer ofício.
O líder cubano entrou porta da chancelaria portuguesa e, no meio de uma confusão de pobreza franciscana, com cadeiras a ameaçar cair (o embaixador, surpreso, sentado em caixotes), o líder cubano disse a Fernandes Fafe que esperava a resposta a uma mensagem que enviara por Otelo - sem especificar o teor da mesma - e que precisava urgentemente da posição oficial de Portugal.
Fernandes Fafe voou para Lisboa, transmitiu a questão de Fidel a Melo Antunes, então ministro dos Negócios Estrangeiros, e este mandou-o esperar pela resposta. Demorou exactamente uma semana até que lhe chegasse algo: "Olhe, conto com o seu talento. Não há resposta", disse Melo Antunes ao embaixador.
Fernandes Fafe regressou a Havana e pediu um encontro com Fidel Castro. Demoraram a conceder-lhe um audiência. O embaixador não insistiu, os cubanos já estavam a caminho de Angola. Sem esperar.
Dias antes da independência, travando assim a entrada em Luanda das tropas da UNITA, apoiadas pelos sul-africanos.
Otelo, no lançamento do livro, explicou que dissera então a Fidel que, em Portugal, ninguém iria ajudar o MPLA a nível militar e a ordem era "nem mais um soldado para as colónias". Por isso, ele, Fidel, em nome do internacionalismo, deveria mandar soldados cubanos para Angola: "Têm aí elemento negros que podem passar por angolanos. Falam espanhol, é certo, mas chegados a Angola, ficam mudos", terá dito o militar de Abril ao líder cubano. Quanto a Costa Gomes, Otelo garante que falou com ele, depois de um Conselho da Revolução, às seis da manhã, assim que chegou de Cuba.
Mário Soares, por sua vez, justificou a atitude de Costa Gomes em negar-se alguma vez a reconhecer ter recebido tal mensagem - que, vista à luz da época, implicaria uma cedência oficial de Portugal - como uma atitude "inteligente". Ele sabe bem como se faz história, pois também já foi Presidente da República.


(Peço desculpa da fraca qualidade de som e imagem da gravação, mas isto serve para pelo menos lembrar-me das palavras de Otelo sobre esta história)

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1 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

(Comentário não directamente relacionado com esta posta)


Bilderberg Confirmed: Westfields Marriott In Chantilly June 5-8

http://prisonplanet.com/articles/may2008/052108_bilderberg_confirmed.htm

21 maio, 2008  

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