Postais de Lisboa
No diário "Público" de hoje, numa carta de leitor, Ricardo Cruz, que é economista e professor universitário, critica a crónica "O Porto deprimido", escrita por Miguel Sousa Tavares, a 13 de Fevereiro.
Se conseguirem consultar os arquivos deste blogue poderão constatar que, naquele mesmo dia, escrevi aqui um comentário intitulado "O Porto suprimido", onde explico as razões para tal supressão.
Hoje, ao ler a carta de Ricardo Cruz, que não conheço, não pude deixar de notar que na parte final da mesma diz o seguinte:
"Em M.S.T., habituei-me a elogiar a procura da verdade. Porquê, então, bazófia tão suburbana? Vamos crer que M.S.T. apenas conhece mal o Porto. Porque o Porto que alguns gostariam de ver deprimido - ou suprimido - é o Porto que está vivo e que, com o país, mostrará que o caminho do futuro é outro que não este. É o Porto das pessoas. Esse é o meu Porto".
Não reclamo para mim o direito de autor da palavra "suprimido" em jogo directo com o "deprimido", mas constato que a palavra pegou. Agora, na resposta a este leitor, Miguel Sousa Tavares, escreveu o seguinte:
"Queria apenas esclarecer o leitor que não fui eu que inventei que o Porto anda deprimido. De há meses para cá que não oiço outra conversa no Porto e às gentes do Porto. Mas se alguém de fora (mesmo alguém tão ligado ao Porto como eu) se atreve a reproduzi-lo, vem logo a acusação de 'sobranceria' e o inevitável queixume de que eu não sei o que é 'ter de ir a Lisboa para carimbar um papel' (sempre gostava de saber que extraordinários papéis serão esses...). É a isto exactamente que eu chamei provincianismo e que, ao contrário do bairrismo - coisa diferente e saudável - é hoje a maior força antiprogresso e a maior causa de depressão do Porto".
Eu, como cidadão português e natural da cidade do Porto onde vivi 24 anos dos meus 31 anos de vida (estou em Lisboa desde 1997), tenho a dizer que só estou em Lisboa porque, naquela altura, para poder entrar para os quadros do semanário "Tal&Qual" disseram-me que teria de vir trabalhar para Lisboa, pois bastava-lhes ter uma única pessoa no Porto.
Quanto aos "extraordinários papéis" referidos por Miguel Sousa Tavares, não iria tão longe em algumas observações, mas gostaria de referir aqui o facto de as pessoas do Porto, quando precisam de falar directamente com uma determinada pessoa que vive na capital ou têm de consultar os arquivos de algum organismo centralizado, são obrigados a gastar um dia inteiro de viagem para sair da sua terra, vir à capital, e regressar à noite para junto da família.
A uma pessoa da capital não se lhe pede este sacrifício.
Por isso é que os portuense (e demais cidadãos de fora da capital), são obrigados a ser organizados, válidos e empenhados.
Falta-lhes depois a compreensão das gentes da capital (recordo que uma das primeiras coisas que ouvi quando cheguei a Lisboa foi: "Não sei porque os portuenses dizem mal de nós. Nós nunca falamos de vocês...", ao que eu respondi: "Por isso mesmo!")
Sem esquecer ainda que todas as deslocações do Porto a Lisboa custam dinheiro.
Se o portuense não vier em comboio, mas sim em camioneta (que demora sensivelmente o mesmo tempo, mas fica mais barata), paga 26 euros, ida e volta. Sete horas de viagem no total. Refeições em Lisboa não ficam por menos de 10 euros. Transportes locais, se tiver de ser táxi - para aproveitar faixas bus e não arriscar atrasos nas ligações de metro -, nunca gastará menos de 15 euros. Sem esquecer mais uns 10 euros no Porto. Jantar, depende...
No total, um dia normal de trabalho para um portuense que tenha de investir pessoalmente numa vinda a Lisboa, sem gastar muito, chega facilmente aos 60 euros...
Para ganhar quanto? Os 100 euros que Lisboa depois lhe pagará?
E vai deduzir quanto em impostos? 20 euros?
Quanto tira depois de lucro? 20 euros?
E o colega de Lisboa?
Quanto gasta ele para fazer o mesmo trabalho?
Se calhar só paga o bilhete de metro, pois pode poupar a comer em casa dos pais.
Para o cidadão de Lisboa é tudo lucro e, o pior, é que depois nem sequer dá o devido valor ao trabalho que teve...
Por isso é que os portuenses são gente de outra raça.
Se Miguel Sousa Tavares sabe isso e não o diz, então é porque se esqueceu... Só pode ser.
Se conseguirem consultar os arquivos deste blogue poderão constatar que, naquele mesmo dia, escrevi aqui um comentário intitulado "O Porto suprimido", onde explico as razões para tal supressão.
Hoje, ao ler a carta de Ricardo Cruz, que não conheço, não pude deixar de notar que na parte final da mesma diz o seguinte:
"Em M.S.T., habituei-me a elogiar a procura da verdade. Porquê, então, bazófia tão suburbana? Vamos crer que M.S.T. apenas conhece mal o Porto. Porque o Porto que alguns gostariam de ver deprimido - ou suprimido - é o Porto que está vivo e que, com o país, mostrará que o caminho do futuro é outro que não este. É o Porto das pessoas. Esse é o meu Porto".
Não reclamo para mim o direito de autor da palavra "suprimido" em jogo directo com o "deprimido", mas constato que a palavra pegou. Agora, na resposta a este leitor, Miguel Sousa Tavares, escreveu o seguinte:
"Queria apenas esclarecer o leitor que não fui eu que inventei que o Porto anda deprimido. De há meses para cá que não oiço outra conversa no Porto e às gentes do Porto. Mas se alguém de fora (mesmo alguém tão ligado ao Porto como eu) se atreve a reproduzi-lo, vem logo a acusação de 'sobranceria' e o inevitável queixume de que eu não sei o que é 'ter de ir a Lisboa para carimbar um papel' (sempre gostava de saber que extraordinários papéis serão esses...). É a isto exactamente que eu chamei provincianismo e que, ao contrário do bairrismo - coisa diferente e saudável - é hoje a maior força antiprogresso e a maior causa de depressão do Porto".
Eu, como cidadão português e natural da cidade do Porto onde vivi 24 anos dos meus 31 anos de vida (estou em Lisboa desde 1997), tenho a dizer que só estou em Lisboa porque, naquela altura, para poder entrar para os quadros do semanário "Tal&Qual" disseram-me que teria de vir trabalhar para Lisboa, pois bastava-lhes ter uma única pessoa no Porto.
Quanto aos "extraordinários papéis" referidos por Miguel Sousa Tavares, não iria tão longe em algumas observações, mas gostaria de referir aqui o facto de as pessoas do Porto, quando precisam de falar directamente com uma determinada pessoa que vive na capital ou têm de consultar os arquivos de algum organismo centralizado, são obrigados a gastar um dia inteiro de viagem para sair da sua terra, vir à capital, e regressar à noite para junto da família.
A uma pessoa da capital não se lhe pede este sacrifício.
Por isso é que os portuense (e demais cidadãos de fora da capital), são obrigados a ser organizados, válidos e empenhados.
Falta-lhes depois a compreensão das gentes da capital (recordo que uma das primeiras coisas que ouvi quando cheguei a Lisboa foi: "Não sei porque os portuenses dizem mal de nós. Nós nunca falamos de vocês...", ao que eu respondi: "Por isso mesmo!")
Sem esquecer ainda que todas as deslocações do Porto a Lisboa custam dinheiro.
Se o portuense não vier em comboio, mas sim em camioneta (que demora sensivelmente o mesmo tempo, mas fica mais barata), paga 26 euros, ida e volta. Sete horas de viagem no total. Refeições em Lisboa não ficam por menos de 10 euros. Transportes locais, se tiver de ser táxi - para aproveitar faixas bus e não arriscar atrasos nas ligações de metro -, nunca gastará menos de 15 euros. Sem esquecer mais uns 10 euros no Porto. Jantar, depende...
No total, um dia normal de trabalho para um portuense que tenha de investir pessoalmente numa vinda a Lisboa, sem gastar muito, chega facilmente aos 60 euros...
Para ganhar quanto? Os 100 euros que Lisboa depois lhe pagará?
E vai deduzir quanto em impostos? 20 euros?
Quanto tira depois de lucro? 20 euros?
E o colega de Lisboa?
Quanto gasta ele para fazer o mesmo trabalho?
Se calhar só paga o bilhete de metro, pois pode poupar a comer em casa dos pais.
Para o cidadão de Lisboa é tudo lucro e, o pior, é que depois nem sequer dá o devido valor ao trabalho que teve...
Por isso é que os portuenses são gente de outra raça.
Se Miguel Sousa Tavares sabe isso e não o diz, então é porque se esqueceu... Só pode ser.
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