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20080415

O segredo dos segredos norte-americanos sobre a nossa Revolução

Comprei este livro do jornalista e blogger Nuno Simas...



Tem lá detalhes inéditos, de documentos que ele recolheu junto da biblioteca Gerald Ford. Há um ano, graças a outros documentos que também surgem no livro, fiz este artigo para a Focus...





Podem encontrar aqui os originais dos arquivos norte-americanos.
O Nuno Simas, contudo, começa o livro com a defesa da versão oficial de que os EUA estavam a "leste" em relação ao golpe que preparava para o dia 25 de Abril de 1974 e, mais à frente, cita Henry Kissinger a queixar-se de que os EUA não tinham de andar a prever golpes pelo mundo fora. Dito assim, parece mesmo que nada se sabia...



Só que, em 2003, no livro "Eu Sei Que Você Sabe", apontei algumas evidências factuais que nos permitem pensar em sentido contrário. E isso começava com esta notícia do "Diário de Notícias" do dia 7 de Abril de 1974...



Entenda-se que o embaixador norte-americano, Stuart Nash Scott, era uma pessoa inexperiente quanto à diplomacia de Portugal, pois chegara em Janeiro de 1974 e não conhecia muita gente em Lisboa. É dito que veio para cá apenas para gozar o sol porque Lisboa era um poiso onde nada se passava - excepto, é claro o conflito de Israel, em Outubro de 1973, que obrigara a uma acesa troca de telegramas diplomáticos entre Washington e Lisboa por causa do uso da base das Lajes nas missões norte-americanas de apoio ao governo de Telavive. Coisa pouca... Quem geria a embaixada norte-americana em Lisboa era um senhor chamado Richard Post, o número 2 e que substituira o anterior embaixador durante um ano. Richard Post, antes de vir para Lisboa, servira em Angola, onde conheceu muitos militares que viriam a subir ao poder depois do golpe.
Conforme me explicou um outro militar de Abril - Otelo Saraiva de Carvalho - qualquer golpe de Estado, para ter sucesso, tem de ocorrer numa terça-feira, quarta-feira ou quinta-feira... Porquê? Para haver tropas... Não se pode fazer uma revolução ao fim-de-semana ou nos dias mais próximos. O golpe das Caldas da Rainha, a 16 de Março de 1974, falhara porque acontecera de sexta-feira para sábado... Já o 25 de Abril de 1974 teve lugar numa quarta-feira para quinta-feira, uma das duas datas ideais para garantir o sucesso.
Um adido militar na embaixada norte-americana em Lisboa que estivesse em contacto com Washington e soubesse que algo se iria passar, mas desconhecesse a data concreta, saberia, contudo, que um golpe teria de ocorrer num daqueles três dias da semana.
Diz-nos a história, a PIDE sabia que se preparava algo em grande para o dia 1 de Maio de 1974, dia do Trabalhador, uma quarta-feira. Se tinha de haver um golpe de Estado em Portugal feito por tropas militares com uma linha de orientação próxima da NATO - ou seja, distante dos movimentos de esquerda que se previam formar no 1 de Maio "sangrento" - esse golpe teria de ter lugar na terça, quarta ou quinta-feira antes de 1 de Maio... Ou seja, nos dias 23, 24 ou 25 de Abril (26 seria sexta, 27 e 28 o fim-de-semana, segunda seria 29 e, terça-feira, dia 30 era um dia demasiado próxima do 1 de Maio).
Afastar o embaixador dos EUA de Lisboa nos dias 23, 24 e 25 de Abril era imperioso para garantir o sucesso do golpe, já que os EUA não podiam intervir ou correr o risco de serem considerados suspeitos de preparar ou apoiar os golpistas (se os EUA tivessem de intervir a 25 de Abril teriam de o fazer a favor de Marcello Caetano, uma vez que era ele o governante de um país membro da NATO e não convinha nada dar a entender que os EUA apoiaram golpes militares e mudança de regime dentro da esfera de influência NATO. Afinal, isto não era a Checoslováquia em 1968).
E assim aconteceu... E ainda hoje se defende que os EUA nada sabiam do que se iria passar.
Tenho pena que o Nuno Simas tenha embarcado pelo aspecto mais fácil que foi o de optar por esquecer aquela pequena notícia de 7 de Abril e as ponta soltas que a mesma comporta. Preferiu o lado mais simples para registar a História...
No meio disto tudo, desconheço ainda se o Nuno Simas viu o telegrama que o cônsul norte-americano em Luanda, Briggs, mandou para Washington a 7 de Janeiro de 1974 onde diz que um bem relacionado militar de baixa patente (seria um capitão?) o informou de que o golpe de extrema-direita de Kaúlza de Arriaga é algo "exagerado" em relação ao que se "estava realmente a preparar" - "what actually is afoot"... e o que se estava a preparar? o 25 de Abril de 1974, é claro...



Se não acredita e que ver o original, vá aqui.

Outro detalhe que mencionei há uns tempos é o artigo do diário norte-americano "Washington Post", datado de 8 de Abril de 1974 - ou seja, o dia seguinte à publicação da notícia de que o embaixador dos EUA iria estar ausente de Lisboa no dia do golpe que se avizinhava -, onde se dá conta de que os homens de negócios em Portugal dão luz verde a uma mudança de regime no país desde que tal seja levada a cabo por Spínola...
Enfim, o que vale é que estou também a preparar uma continuação do "Eu Sei Que Você Sabe" - interrompida devido ao facto de ter escrito "O Enigma da Praia da Luz" - mas em breve direi aquilo que continuam a não querer dizer-vos.

2 comentários:

  1. Esse autor tem uma versão oficial a defender, não pode andar aí a investigar demais...

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  2. Fiz a minha tese de fim de curso com o tema "To what extent were the USA responsible for the failure of the PCP in the elections of '75" e quando vi este livro fiquei com vontade de organizar um debate ou sentar me e conversar com Nuno Simas. Vou começar a ler o livro esta semana e, claro está, mais uma vez, historiadores e políticos se confrontam com "as duas verdades" históricas em consequencia da diferente interpretaçao de factos!

    Lígia Fradinho
    ligia.fradinho@gmail.com

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