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20111201

Mário Soares e o risco de reescrever a História

Mário Soares não está gagá, mas sente-se impune e, pela frente, encontra jornalistas sem memória e um povo adormecido. Por isso engana-se e ninguém dá por isso. A recente obra autobiográfica - "Um político assume-se – ensaio autobiográfico político e ideológico" contém um pequeno mas determinante erro histórico. Diz Mário Soares, na página 221, que, a 17 de Agosto de 1974, na altura em que o director-adjunto da CIA, Vernon Walters, visitou Portugal, encontrou-se com o "Presidente Costa Gomes"...



No entanto, nessa data, o Presidente da República ainda era o general António de Spínola, autor do livro "Portugal e o Futuro", editado em Fevereiro desse mesmo ano e que legitimara o general do monóculo para surgir no dia 25 de Abril como a pessoa que receberia o poder das mãos de Marcello Caetano. Spínola só deixou de ser Presidente da República cerca de um mês depois da visita do homem-forte da CIA, na sequência do fracasso da manifestação da "Maioria Silenciosa", a 28 de Setembro. Mário Soares, que era ministro dos Negócios Estrangeiros, não deveria ter deixado passar numa obra autobiográfica um erro tão óbvio, tanto mais que, poucas páginas mais à frente, menciona precisamente a demissão de Spínola. O engano, pelos vistos, também passou despercebido aos revisores da obra que, sendo assim, terão de alterar esta informação numa próxima reedição.
O maior problema do erro de Mário Soares, no entanto, é o de lançar ainda mais dúvidas em relação ao papel da CIA na Revolução portuguesa de 1974. António Spínola, que era um defensor da ideia da criação de uma Federação Lusitana com as ex-colónias, não agradava à política de independência defendida pelos EUA. Sendo assim, Costa Gomes seria o preferido dos norte-americanos. Daí que o "erro" de Soares não se trata de um "engano" da sua cabeça, pois, para a CIA e para Mário Soares, o verdadeiro "Presidente" já era Costa Gomes e não Spínola...
Foi ainda na sequência dessa visita de Vernon Walters a Portugal que ficou combinado que o embaixador dos EUA iria ser substituído. No regresso aos EUA, o chefe da CIA sugeriu ao secretário de Estado Henry Kissinger um nome para lidar com o problema português: Frank Carlucci. E foi a amizade entre Frank CarlucCIA e Mário Soares que permitiu ao líder do PS destacar-se durante o Verão Quente de 1975. Uma amizade que perdura e, exemplo disso, foi o recente encontro entre ambos, logo após as eleições legislativas, na antiga lavandaria da residência do embaixador norte-americano em Lisboa, à Lapa...



Resulta por isso estranho que Mário Soares não tenha incluído qualquer referência ao nome do "amigo americano" - Carlucci, Frank - nesta sua grossa obra autobiográfica...



E, recorde-se como facto, Frank Carlucci, depois de ter sido embaixador em Portugal, em 1978, foi nomeado director-adjunto da CIA, afinal o mesmo cargo que Vernon Walters ocupava quando visitou Portugal e, segundo e "evangelho" de Soares, encontrou-se com o "Presidente" Costa Gomes.

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