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20110206

A revolução é dos parvos

Desde pequenino que fui habituado a não contestar o sistema. Afinal, para quê? Tínhamos tudo: televisão, carro, comida, liberdade de expressão, um primeiro-ministro democraticamente eleito, um Presidente da República que era "fixe" e os americanos eram nossos amigos e protegiam-nos dos russos. Em 1989, caiu o muro de Berlim e o mundo parecia que ia ficar ainda melhor, pois os meninos russos também iriam passar a ter tudo aquilo que nós já tínhamos: televisão, carro, comida, liberdade de expressão, um primeiro-ministro democraticamente eleito e um Presidente da República igualmente "fixe". E os americanos não iriam mandar fazer mais filmes do Rocky como aquele em que ele batia no russo mau. Nessa altura, andava a fazer fanzines de BD e era feliz. Tirava as fotocópias no escritório do meu pai e depois de os agrafar e dobrar, colocava-os à venda nas mais conhecidas livrarias do Porto. Às vezes, recebia encomendas de Lisboa. Nunca me esqueci da primeira morada lisboeta para onde mandei um exemplar do fanzine: Calçada dos Mestres e, anos mais tarde, por coincidência, fui morar para lá. Diziam então que a História tinha chegado ao fim e não iria haver mais guerras no mundo. Durou pouco tempo, pois os senhores mais velhos arranjaram uma guerra no Iraque, por causa de uma coisa qualquer no Koweit. Aquilo acabou com a vitória dos americanos, mas o pior era a gaivota presa no crude que os senhores da Benetton puseram na capa da revista que fui comprar à loja de Santa Catarina. O mundo começou a ficar mais complicado: a televisão passou a ter mais de 100 canais e assim não há vontade de ver um sequer. Os carros passaram a dominar as cidades e a gasolina é mais cara. A comida está mais cara e, por vezes, não comemos o que queremos. Dizem que continua a haver liberdade de expressão, mas vemos cada vez menos a expressão dessa liberdade, pois o semanário onde trabalhei durante quase dez anos, fechou. O primeiro-ministro é democraticamente eleito, mas a abstenção aumentou e os pequenos partidos ficam de fora do sistema. O Presidente da República é aquele que era primeiro-ministro. Está no jogo do poder desde 1981 - altura em que era ministro das Finanças - como senhor do Egipto. Dizem agora que somos todos parvos, por andarmos a estudar para sermos escravos, como aqueles que antes ergueram pirâmides - como se hoje os nossos engenheiros soubesse erguer pirâmides como aquelas do Príncipe do Egipto. Gostaria de dizer a quem sonha que é possível mudar o sistema e melhorar a nossa vida, gostaria de deixar uma mensagem de esperança. A minha esperança são aqueles que nasceram depois de 1989, os tais para quem já é uma sorte poderem estagiar. Guiem-nos, revoltem-se - com ou sem violência, de preferência sem (não caiam nessa armadilha), mas apareçam com ideias e propostas. Não se fiem nas "redes sociais", pois essas não tocam nas pessoas - antes pelo contrário. A revolução faz-se na rua, não será televisonada... Estarei lá para ajudar com a expiação dos meus erros, com a experiência daquilo que me custou a perder. Para que, juntos, ganhemos.

4 comentários:

  1. Tem graça este teu texto. Em Dezembro, quando passaram 30 anos sobre o atentado de Camarate, lembro-me de ver peça atrás de peça, na televisão, da dita época. Fiquei estarrecida quando me dei conta que os fulanos que então apareciam na televisão - ministros de várias espécies, presidentes disto e daquilo, VIPs mais ou menos VIP, vices e secretários e sei lá mais o quê... eram praticamente todos os mesmos que continuam a encher os noticiários de agora, fora os que morreram pelo caminho. 30 anos e o pessoal "que manda" é exactamente o mesmo. Apre!

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  2. Fred,

    Em breve, nesta "União Europeia de Repúblicas Socialistas Soviéticas" esse tipo de dissertação levar-te-à de cana. Nos EUA, já é o suficiente para te candidatares à "NO FLY LIST".
    Cá para mim, quando fores para a rua, CONTA COMIGO!

    offstreammedia.wordpress.com

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  3. Tanto o Fred como a Astro deveriam era desmascarar a filha da rainha ...

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  4. Então mas ninguém pega no caso Karocha porquê afinal ?

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